Cientistas mulheres são mais afetadas pela pandemia: como garantir oportunidades justas?

Programa Para Mulheres na Ciência é um dos que ajustou seu regulamento para incluir cientistas mães

Não restam dúvidas: a chegada da Covid-19 e o isolamento social causado pela doença afetaram a produtividade acadêmica no último ano. Mas será que todos os cientistas estão sendo impactados da mesma forma? Um levantamento realizado pelo Movimento Parent in Science durante abril e maio de 2020 mostra que não: a partir das respostas de quase 15 mil cientistas, o resultado apontou que homens, especialmente os sem filhos, foram os menos afetados pela pandemia - já mulheres negras, com ou sem filhos, viram o nível de produtividade cair consideravelmente nos mesmos meses. 

Com os dados, a pesquisa levanta a discussão: não seriam gênero, raça e maternidade fatores que contribuem para a sub-representação da mulher na ciência, evidenciando a necessidade de medidas efetivas para garantir oportunidades justas a pesquisadoras em programas e editais?

Gênero, raça e maternidade contribuem para sub-representatividade das mulheres na ciência 

De acordo com os números levantados pelo Movimento, dos docentes entrevistados que submeteram artigos científicos como planejado, 76% deles eram homens sem filhos contra apenas 47,2% de mulheres brancas com filhos - e 46,5% de mulheres negras com filhos. Ainda segundo a pesquisa, apenas 4,1% dessas mulheres docentes com filhos afirmaram estar conseguindo trabalhar remotamente. E apesar das mães serem mais afetadas, mulheres sem filhos ainda estão desfavorecidas em relação aos homens: neste caso, o percentual é de 18,4% contra 25,6%.

Para o Parent In Science, os números criam um referencial teórico importante para orientar políticas públicas de auxílio às mulheres e mães na área acadêmica. “A necessidade de ações afirmativas em prol da diversidade e inclusão na ciência torna-se ainda mais evidente durante o período de pandemia”, destaca o relatório.

Para Mulheres na Ciência ajustou regulamento para evitar garantir oportunidade de inclusão de cientistas mães

Dentre as sugestões descritas no documento da pesquisa para mitigar essa disparidade e garantir mais inclusão na ciência, o Movimento Parent in Science destaca a elaboração de editais específicos para os grupos mais atingidos - para evitar um aumento da disparidade de gênero e raça -, além do aumento do prazo para submissão em editais de programas.

O Para Mulheres na Ciência, por sinal, é um exemplo de programa para cientistas que já tomou atitudes concretas no sentido de apoiar mulheres em seus desafios ao conciliar a vida pessoal e profissional. Considerando outra pesquisa feita em ocasião dos 15 anos do programa no Brasil no ano passado, a L’Oréal, bem como os parceiros Academia Brasileira de Ciências e Unesco, tomaram a decisão de ajustar o regulamento do programa no Brasil, ampliando a oportunidade para as mães cientistas.

Equilibrar maternidade e vida acadêmica não é tarefa fácil, e quem sabe bem dessa rotina é Vivian Costa: cientista, mãe e ganhadora do Programa Para Mulheres na Ciência no ano passado. “Eu consegui [conciliar pesquisa e cuidados com o filho] com ajuda da minha família, que sempre me apoiou. Mas nem todas as pesquisadoras têm essa rede e, por isso, é essencial que exista incentivo para mães cientistas. A gente tem lutado muito para ter igualdade na área da ciência, que é tão importante para a humanidade. Ganhar o prêmio em um momento em que a ciência brasileira é cada vez mais desafiada e julgada, me fez ver que, apesar de tudo, eu estava no caminho certo”, destacou Vivian Costa em entrevista ao Projeto Celina, de O Globo.

Como funciona o Programa Para Mulheres na Ciência? Inscrições para a edição 2021 estão abertas!

Pelo Programa Para Mulheres na Ciência, todo ano, sete jovens pesquisadoras das áreas de Ciências da Vida, Ciências Físicas, Ciências Químicas e Matemática são contempladas com uma bolsa-auxílio de R$50 mil cada para dar prosseguimento aos seus estudos. Para participar, é necessário que a candidata tenha concluído o doutorado a partir de 01/01/2014 - sendo que, para mulheres com um filho, o prazo se estende por mais um ano e, para quem tem dois ou mais filhos, o prazo adicional será de dois anos. Além disso, a cientista deve ter residência estável no Brasil, desenvolver projetos de pesquisa em instituições nacionais, entre outros requisitos.

O regulamento completo e mais informações sobre o programa estão disponíveis no site https://www.forwomeninscience.com/challenge/show/9. Para se inscrever, é importante que, ao entrar no site, a candidata altere o idioma da página para o Português no canto superior direito da tela. As vencedoras da edição 2021 serão conhecidas a partir de agosto, e entrarão para o time ao lado de outras 103 cientistas brasileiras premiadas pela relevância dos seus trabalhos no programa.